Transformação Digital: do Fogo à Nuvem – Por Rossana Sadir   Historicamente o mundo passou por tr...

Transformação Digital: do Fogo à Nuvem – Por Rossana Sadir

Historicamente o mundo passou por transformações que mudaram a cultura e estilo de vida de seus habitantes, tais como: o fogo, a roda, a imprensa, a máquina a vapor, o computador e mais recentemente o celular. A sobrevivência de espécies, como qualquer evento dentro do modelo darwiniano, depende não de sua força ou vontade de vencer, senão de sua habilidade de se adaptar e evoluir com cada transformação, a chamada Teoria da Evolução, que também pode ser aplicada às empresas.

Nos últimos anos, tivemos uma avalanche de novas tecnologias e tendências, mudando o comportamento e os interesses de nossos funcionários, cidadãos e consumidores, e afetando profundamente a forma de operar das empresas. Se antes o jogo era ser ganhador vs competidores para maximizar o ganho econômico dos acionistas, hoje se fala de colaboração e perenidade/ sustentabilidade para maximizar o impacto positivo social, ambiental e econômico na sociedade – o que se conhece por Capitalismo de Stakeholders.

A expressão VUCA ganhou muita tração nos últimos anos, refletindo o mundo Volátil, Instável, Complexo e Ambíguo que vivemos. A liderança nas organizações deve instituir o VUCA Prime para assegurar a direção da empresa neste mundo em transição – dar Visão, Entendimento, Clareza e Agilidade. Essas são as qualidades que se requer para garantir a perenidade e sucesso dos negócios. As três primeiras são velhas conhecidas, mas agilidade nunca foi tão relevante: são poucas as empresas que morrem por mudar rápido demais, mas conhecemos muitas que já se foram por negarem ou ralentarem o processo de transformação. Por isso, hoje não se discute mais se se deve fazer ou não a Transformação Digital, sabe-se que é uma questão de sobrevivência e que mais que discutir os “ses” e “quês”, o enfoque está no “como” e “quando”. Com a rapidez das mudanças, vemos que a estratégia não consegue mais ser um mapa claro das iniciativas e ações a serem tomadas nos próximos 3 a 5 anos como anteriormente. Mas senão é mapa, a estratégia ainda tem a função de bússola, dando o Norte que precisa seguir para chegar ao seu objetivo. Esse Norte, essa estrela guia, tem que se manter estável e clara para todos.

No apoio ao líder para definir os quês, “comos” e “quandos”, pode-se analisar a empresa em duas dimensões: 1. seu apetite a inovação e investimento, 2. A dinâmica de inovação de seu setor, ou como diz o jargão interno: ou se faz por amor, ou pela dor. Com base nessas dimensões, identifica-se o alcance de estratégia de inovação a ser recomendada: Se tanto apetite como dinâmica do setor forem baixos, pode-se desenvolver uma estratégia incremental (um passo mais no caminho atual), se ambos são médios – uma estratégia evolutiva (a partir do modelo em curso, desenha-se novos canais ou produtos); agora se ambos forem altos, deve-se partir para uma estratégia transformacional, que não tem o modelo atual como referência e buscam tendências e benchmarks inclusive em outros setores.

Trazer visão e clareza de tendências e oportunidades via consultorias, matrizes de risco, ferramentas de cenarização ou outras são vitais para a definição do que, como e quando. É o triênio mais difícil de mover como líder – Entender a necessidade da mudança, Querer Mudar e Agir para Mudar, basicamente onde muitas das discussões estratégicas são centradas, e onde muitas falham. O erro mais comum nas empresas é declarar sua necessidade de mudança, mas lançar-se em iniciativas pontuais e pirotécnicas, distraindo-se e festejando com fogos de artificio, sistemas e apps que não têm impacto sobre o negócio, nem são replicáveis ou escaláveis. Quantos de nós não temos exemplos assim nas empresas em que atuamos?

Pessoalmente, já atuei como CEO e Conselheira na transformação digital em 4 etapas:
1. Inclusão digital – trazer o cliente para o ambiente digital
2. Inteligência – trabalhar com data analytics, BI, AI e Machine Learning para aumentar a atratividade, retenção e produtividade dos clientes.
3. Social selling – transformar clientes em promotores da marca, influenciando sua rede de contatos e angariando novos clientes.
4. Ecossistemas – a partir de um modelo de negócios estabelecido, desenvolvimento de soluções internas, open innovation ou M&A para ampliar a atuação seja horizontalmente, com novos elos da cadeia como pagos ou logística, vertical – novos produtos ou negócios – ou transversalmente, elementos que adicionem valor ao ecossistema, como conteúdo e entretenimento/ fun.

Podemos achar que muitas das empresas já superaram as fases 1 e 2 e já estão evoluindo para outras ligas, mas a verdade é que  muitas estão inclusive em várias etapas dependendo do negócio que gerenciam. Os shopping centers por exemplo, estão buscando enquadrar-se na etapa 1, de inclusão digital, ainda com grande esforço. As empresas de bens de consumo e varejo tem investido ultimamente na inteligência, para entender o comportamento de seus clientes, e poder aumentar sua ativação. Magalu e Amazon, por exemplo, desenvolvera social selling e o ecossistema de market place, abrindo novos canais.

A transformação digital não é uma estratégia por si só, mas deve apoiar e permear vários objetivos estabelecidos pela organização: crescimento, melhoria/ automatização de processos ou ganhos de produtividade. Estratégias de crescimento, por exemplo, podem ser desenvolvidas em 4 frentes: via crescimento geográfico, aumento da gama de produtos ou verticais de atuação, novos públicos-alvo, e/ou novos canais, e em todas essas frentes deve-se incluir o olhar de inovação e tecnologia.

Bom, dito tudo isso sobre Transformação, como partimos para ação? A McKinsey em um recente artigo citou alguns passos a seguir para estruturar um plano de transformação:

1.       Jornada do Cliente – identificação dos principais clientes-chave, e mapeamento e identificação dos pontos de fidelização e dor.

2.       Serviço ao cliente – definição dos canais de venda e atendimento para informações e transações.

3.       Analytics – uso de informações e modelos preditivos para apoiar as áreas: marketing em ações direcionadas, P&D na redução de custos e tempos de desenvolvimento de produtos, Otimização de Pricing, Estoques ou processos em Supply Chain.

4.       Transformação Ágil – baseado em times multidisciplinares e iterativos, com autonomia, onde a liderança é facilitadora da execução. Esse novo modelo se contradiz com o modelo anterior de comando e controle, hierarquia e especialização.

Finalmente, qual o papel do líder nesse contexto?

1.       Criação de um ambiente e cultura que incentive a inovação e tomada de decisões. O líder deve atuar como um polinizador de ideias – trazendo provocações, tendências, cenários, benchmarks, oportunidades e ferramentas que quebrem a casca e abram a empresa para uma visão de futuro. Além disso, deve assegurar-se que as equipes desenvolveram as competências necessárias para a transição.

2.       Execução – acompanhamento da implementação da estratégia. Várias ferramentas podem ser usadas nesta etapa, como BSC, 4DX ou mais recentemente OKRs, de maneira a medir, monitorar e traquear o desenvolvimento, assegurando cumprimento de metas. Vejo dois erros na discussão de OKRs em conselhos:

a.       A revisão de OKRs não substitui uma discussão estratégica, eles proporcionam uma foto de onde estamos vs a direção que vamos, mas representam a árvore, não o bosque nem o ambiente em que está inserido. O quanti não substitui o quali nem o todo em uma estratégia.

b.       Se algum OKR não estiver dando certo, não necessariamente a estratégia – o “o quê” que dizíamos antes - está errada, pode ser mais uma questão de “como” e “quando”. Temos que continuar vendo o filme e decidir segundo o estado da foto, se algum ajuste é necessário.

3.       Colaboração – fomentar ambiente de troca onde se possa aprender e melhorar continuamente, combinando e somando competências com competidores (coopetition), clientes, fornecedores ou players de outras indústrias.

Para finalizar, muitos são os desafios da transformação digital: cultura avessa a mudanças, estruturas organizacionais muito centralizadoras e hierárquicas, falta de capital. A certeza que temos é que a transformação sim é para todos, mas temos que ter a sensibilidade de definir o que, como e quando segundo o DNA e momento de cada empresa.