O Varejo de Moda Sustentável - Por Luiz Goes

O Programa Ambiental das Nações Unidas – UNEP - divulgou o seu relatório anual 2021 e trouxe alguns números impressionantes sobre a questão ambiental e a sua relação com o vestuário e, consequentemente, com o varejo de moda no mundo.

Dentro de todos os conceitos ESG, a sigla que congrega os temas de Sustentabilidade, Social e Governança que vêm impactando o modo de operar e de se estruturar das empresas de diversos segmentos, o tema é extremamente relevante para todo os elos da cadeia de consumo do vestuário.

Uma cadeia de consumo bastante agressiva ao meio-ambiente

O estudo da ONU aponta que todos os anos, cerca de US$ 500 Bilhões (R$ 2,5 Trilhões) em vestuário são descartados no mundo em aterros e lixões. Este valor se traduz em milhares de toneladas de peças que irão impactar o meio-ambiente colaborando ainda mais para a insustentabilidade do planeta. Os conceitos de durabilidade das roupas aliados à sua qualidade já são quesitos considerados pelos consumidores de forma geral na hora de adquirir uma peça de vestuário. Cada vez mais o descarte de uma peça de roupa será visto da mesma forma que uma sacola plástica disponível no varejo em geral, ou seja, a busca por tecidos biodegradáveis acessíveis e ambientalmente equilibrados.

Da mesma forma, os processos de produção de roupas também assumem um papel importantíssimo na qualificação de marcas na cabeça do consumidor. Você sabia que a lavagem de uma calça jeans durante a sua produção consome 48 litros de água? Pense na quantidade de calças jeans que você já teve na vida e considere isto expandido para a população mundial com bilhões de pessoas e calcule o quanto de água já foi gasta com este tipo de processo produtivo.

Adicionalmente, o estudo da ONU aponta que cerca de 10% do total de emissões de gases-estufa no planeta provém da confecção de roupas e que anualmente esta indústria descarta 500 mil toneladas de microfibras sintéticas nos oceanos a cada ano.

A cadeia da moda emprega 60 milhões de pessoas no mundo e gera R$ 1,5 trilhões de Euros em receita global anual na venda de roupas e calçados. Com base nestes números impressionantes, em 2016 foi fundada a Global Fashion Agenda que congrega dentre outras empresas H&M, Nike, Taget, OVS e Kering com a finalidade de desenvolver novos modelos de negócios sustentáveis que vão, segundo os fundadores, para além das preocupações com o futuro de cada um, mas focam a Humanidade e as futuras gerações. O relatório Pulse of the Fashion Industry de 2017 apontou que as principais marcas de moda observarão um declínio de mais de 3 pontos percentuais em suas margens de EBITDA, caso não mudem suas posturas nos próximos anos sob a ótica da sustentabilidade.

No Brasil estas indicações são traduzidas pela ABVTEX – Associação Brasileira do Varejo Têxtil que congrega os principais varejistas de moda e que são os principais responsáveis pela definição dos parâmetros da cadeia no que tange à utilização e ao impacto nos recursos naturais.

No Brasil a C&A, por exemplo, assume uma série de posturas que vão ao encontro destas novas posturas ambientais para o varejo. Mais de 90% dos produtos de algodão comercializados utilizam matéria-prima adquirida como mais sustentável. Foi também a primeira varejista a oferecer uma coleção Cradle to Cradle Certified® Gold – certificação internacional que garante que cada peça foi desenvolvida com materiais e produtos seguros, circulares e feitos de forma responsável. A empresa chega a utilizar um software - EIM (Environmental Impact Measuring) – para controlar com precisão o volume de água, a energia e os produtos químicos utilizados na fabricação de peças, o que permitiu reduzir o gasto com água na lavagem da calça jeans para 7,4 litros. A utilização de tecnologia baseada em blockchain permite que a empresa tenha total visibilidade da produção de cada peça junto aos fornecedores.

A H&M, empresa globalmente estabelecida e de origem sueca com mais de 5.000 lojas espalhadas em 74 mercados coloca em prática estas questões a partir do momento em que define os critérios para suas coleções e materiais de maneira a serem atraentes e acessíveis fisicamente e em preços ao maior número de pessoas possíveis.

A italiana OVS compila e publica números sobre o impacto das roupas que vende. A empresa idealizou o ECO VALORE composto por 3 índices, cada um relativo à facilidade de reciclagem, à quantidade de água utilizada e ao tamanho da pegada de carbono. Estas informações estão disponíveis aos consumidores nas lojas e na sua loja virtual.

Diretrizes globais para a moda sustentável

A Global Fashion Agenda vem definindo a cada ano a chamada Agenda do CEO de Moda sendo que a de 2021 apontou 5 grandes pontos de atenção:

1.       Ambientes de trabalho respeitosos e seguros
Reforçando políticas em conformidade com os Direitos Humanos

2.       Promover melhorias nos sistemas salariais
Práticas que produzam um sistema salarial mais justo

3.       Sistemas Circulares
Produtos que sejam concebidos, vendidos e coletáveis de forma a permitir o reuso e a reciclagem de produtos têxteis em larga escala

4.       Uso eficiente de água, energia e produtos químicos
Não se deve permitir a emissão de poluentes ao meio ambiente.

5.       Escolha de materiais inteligentes
Reduzir o efeito das fibras atualmente em uso, desenvolvendo fibras inovadoras e mais sustentáveis

A agenda deste ano destaca a necessidade imperiosa da convivência entre os aspectos sociais e ambientais assumindo que um não pode ser alcançado sem o outro, buscando a igualdade o bem-estar com base em valores que abrangem justiça, compaixão e empatia. Além disto a agenda foca cada uma das diretrizes segundo três aspectos: porque isso importa, onde estamos hoje e como agir, impactando cada um nos capacitadores internos da empresa e nas ações externas na relação com o mercado, tanto de fornecedores, como de consumidores.

Este é um tema interessante e que terá que ser absorvido pela indústria da moda, sob pena de ser julgada e abandonada pelo principal elemento desta cadeia e que reúne cada vez mais poder em suas mãos: o consumidor final.

O foco deste artigo é a indústria de moda e sua visão de sustentabilidade, porém estas são preocupações que na atualidade, vêm sendo discutidas por praticamente todos os segmentos e setores econômicos em nível global, desenhando um futuro sem volta nas relações de consumo. A Pandemia acentuou de forma considerável diversos destes aspectos antecipando em alguns anos discussões no mundo dos negócios e que visam garantir a sua perenidade.

Não nos cabe mais discutir se, mas sim quando estas mudanças de postura serão incorporadas definitivamente nos negócios com os quais lidamos cotidianamente. O único recado possível aos empresários, em especial os de pequeno e médio porte é: crie uma agenda para a sua empresa que permita a concepção ou o redesenho de sua estratégia sob estes novos filtros e evite ter que dizer, no futuro breve, que a sua concorrência teve sorte ao permanecer viva no mercado.

Assuntos como este que refletem visões de autoalimentação da economia, bem como conceitos intangíveis vinculados à postura ESG no mundo corporativo são cotidianamente abordados dentro da Wave´s, uma empresa focada no Circular Business, influenciando e inspirando o ecossistema de negócios.